Desde infância, transito pela cidade de
Messias Targino, no médio-oeste do Rio Grande do Norte. Inicialmente, no começo
dos anos setenta do século passado, há mais de quarenta anos, acompanhava meu
pai Epitácio de Andrade, em viagens semanais, quando ele ocupava o cargo de
secretário de administração, na gestão do prefeito Inácio Gabriel da Silva, seu
Inácio Pereira, que na foto aparece ao lado de meus avós paternos, no casamento
de meus pais, em 1959.
A viagem de Patu, município do qual foi
desmembrado, a Messias Targino, era um sacrifício! No jeep de Job ou no Toyota
de Tião Tavares. Durante o verão, a trepidação fazia “dançar” o veículo na
estreita estrada, e no inverno, a ameaça era a travessia dos riachos da Beleza
e da Serra Preta.
No
bicentenário da paróquia de Patu - Foto: Luiz do Foto.
|
No início da adolescência, estudei com vários
messienses no Ginásio Municipal de Patu, onde meu pai era o diretor e minha mãe
Lourdinha Holanda era uma das professoras. No dia 07 de julho de 1977, num
desfile alusivo ao bicentenário da paróquia de Patu, conduzi pelo trajeto uma
placa em homenagem ao padre José Kruza, um dos lutadores pela construção da
capela de Messias Targino.
Desde tenra idade, vi serem sedimentadas as
bases comportamentais que nortearam, ao longo dos anos, a amizade de minha
família com os “Tomaz de Almeida” do velho Junco. Do ex-vice-prefeito Otoniel,
de saudosa memória, ao músico Zé Tomaz, afilhado de meus pais, existe a marca
do respeito e da fraternidade que nos une até hoje. Em doutor Otoni Tomaz de
Almeida, meu mestre da língua francesa e de matemática, vice-diretor do Ginásio
Municipal, numa parceria harmoniosa e responsável com meu pai, está à prova
maior dessa construção social, frutífera e realizadora. Com Gracinha Almeida,
mulher sábia, estamos a construir a superação do preconceito de gênero e etnia.
No novo milênio, a cidade de Messias Targino
teve um desenvolvimento vertiginoso, ao ponto de ser referenciada e laureada
com destaques a nível nacional. Para o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio a
Micro e Pequenas empresas) parece ser a eterna cidade empreendedora.
Ladeado
pelo vereador Pola Pinto e pelo empresário Borginho
|
O desenvolvimento da cidade é atribuído a
ação de diferentes atores sociais que se harmonizam nas suas áreas de atuação.
O sindicalista e vereador Pola Pinto desenvolve importante trabalho na área
sócio-política, com divulgação de seus trabalhos e com a atração de eventos e
investimentos para o município. O empresário Francisco Borges de Andrade, “Borginho”,
montou um complexo comercial, que se espalha pelo estado, permitindo o acesso
ao consumo de eletromóveis e outros bens de uso às parcelas mais pobres da
população.
Borginho escolheu um lugar para expor sua
propaganda por meio de um outdoor, de uma forma que a paisagem natural da Serra
do Cangaíra compusesse a sua visualização estética, harmonizando o marketing
empresarial com a reserva ambiental, idealizada pelo agropecuarista Paulo
Targino, filho do fundador da cidade. No ecossistema da Serra do Cangaíra é
preservada a vegetação da caatinga e sua fauna, com animais ameaçados de
extinção, como o mocó.
Uma das conquistas da cidade está sendo o
desenvolvimento da agricultura familiar, com o incremento da produção das
culturas tradicionais e de hortifrutigranjeiros, melhorando a renda das
famílias e seu padrão alimentar. Tive oportunidade de conhecer a feira agroecológica:
Fiquei encantado com a qualidade dos produtos oferecidos e não resisti à
galinha caipira com cuscuz pilado (no pilão).
Com o desenvolvimento social, a população
messiense está ampliando a sua consciência crítica. No dia 18 de maio de 2002,
iniciamos por Messias Targino, o cortejo antimanicomial, que saiu defendendo e
viabilizando as intenções da reforma psiquiátrica brasileira, passando por Patu
(em parceria com o professor Aluísio Dutra), Belém (com meus familiares) e
Brejo do Cruz (com o ator Edilson Dias), na Paraíba, Jardim de Piranhas (com o
vereador professor Gute), concluindo o trajeto em Caicó (com o sanitarista
Pacífico Fernandes).
O desenvolvimento social também tem
contribuído para aumentar a expectativa de vida da população messiense. Como
resultado das ações do cortejo antimanicomial de 2002, foi implantado,
provisoriamente, o centro de convivência do idoso, cuja inauguração recente de
sua sede própria, contou com as presenças da deputada federal Fátima Bezerra e
da prefeita Shirley Targino.
Não é recente a integração de nossas ações
profissionais e socioculturais em defesa do município de Messias Targino, com o
resgate de personalidades que compõem a sua história. Assim vem sendo os
trabalhos de inspiração histórica voltados para a preservação da memória da
cidadã centenária Francisca Tavares de Oliveira (1884-2002), “Dona Chica
Brejeira”, a pessoa que alcançou maior longevidade no Brasil, e do médico Edino
Jales de Almeida (1940-73), um dos pioneiros da medicina científica no sertão
nordestino.
No dia 09 de abril de 1998, celebramos meu
aniversário no hospital-maternidade Dr. Aderson Dutra, em Patu. Entre os
presentes, estavam: A diretora do hospital Vanda Godeiro; o artífice do ferro
Luiz Tavares; as professoras Raimunda Cleonice Dantas e Isabel Saraiva Forte; e
o cantareiro “Pernambuco”, artesão responsável pela decoração com pedras de várias
obras regionais, entre elas o Santuário do Lima, além de pacientes e
familiares. A data marcou o início das ações de saúde mental no município de
Patu e resgatou a memória do médico Edino Jales de Almeida, atribuindo seu nome
ao programa recém-implantado.
No ano seguinte, com 115 anos, Dona Chica
Brejeira nos acompanhou numa visita a Sereno na comunidade Jatobá, na zona
rural de Patu. Foi a continuidade de um trabalho social que resultou no
auto-reconhecimento do Jatobá, como a primeira comunidade remanescente de
quilombos, completamente legalizada e legitimada no Rio Grande do Norte.
Dona Chica Brejeira participou ativamente do
passeio e elevou a auto-estima dos quilombolas do Jatobá. Visitou a capela de
São Benedito e rezou pela saúde de Sebastião Severino, “Sereno”, líder da
comunidade, confortando-o. Os quilombolas retribuíram a visita comparecendo em
massa a missa celebrada para comemorar o seu aniversário em Messias Targino.
A visita de Dona Chica Brejeira a comunidade
quilombola do Jatobá foi um marco histórico da negritude potiguar e ficou
registrada em fotografias que os comunitários ostentam em murais na sala
principal da casa grande do velho líder Sereno.
No ano passado, tive o prazer de escrever a
apresentação do folheto de cordel “A História de Chica Brejeira”, do poeta
Basto do Córrego Verde. Sobre Dona Chica, redigi: “Tive oportunidade de
desfrutar da agradável companhia e amizade de Dona Chica. Sou testemunha da sua
lucidez de consciência e de sua higidez física”.
Ainda sobre Dona Chica: “A história da mulher
de maior longevidade já registrada no país, começa no Sítio Salobro, zona rural
de Messias Targino/RN, em 15 de setembro de 1884, e veio a falecer, na sua
residência, em 31 de dezembro de 2002, aos 118 anos”.
O folheto de cordel
sobre Chica Brejeira retrata em 40 estrofes de 07 versos a vida da digna mulher
de descendência da negritude, que desde adolescência, cultivava o hábito de
“fumar brejeiro”, daí o apelido, constituindo um verdadeiro desafio à ciência
contemporânea.
Nosso trabalho
cultural em Messias Targino também é estimulador da alfabetização de adultos.
Um exemplo é Océlio Pinto, portador de deficiência neurossensorial, que está
trilhando o caminho das letras.
Sobre o autor, escrevi: “Sebastião Ernesto
dos Santos, conhecido como ‘Basto do Córrego Verde’, é natural de Jardim de
Piranhas/RN, nascido em 20 de janeiro de 1951. Basto é agricultor familiar
aposentado e residente no Sítio Córrego Verde no município de Patu/RN, com vida
social em Messias Targino/RN, onde é sócio do Sindicato dos Trabalhadores da
Agricultura Familiar (SINTRAF)”.
Participei do lançamento do primeiro impresso
do poeta Basto do Córrego Verde, em julho de 2011, durante concorrida atividade
cultural, promovida pelo Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar,
que contou com a participação do cantor Diassis Tomaz de Almeida e estava
exposta ao público, compondo o acervo museológico da festa, a viola que
pertenceu ao menestrel da cantoria Chico Mota.
Em Messias Targino, tenho tido uma dupla
intervenção social. Como agitador cultural e profissional médico do campo da
saúde mental. Mais de uma centena de pacientes, acompanho ou já acompanhei no
município. Quando estava recluso nas dependências da delegacia local um
andarilho em amnésia total, fui acionado para intervir no problema,
conduzindo-o para o hospital geral de Janduís/RN, e depois devolvê-lo à
família, em Teresina, capital do Piauí.
Andarilho
resgatado em Messias Targino
|
Nesta mesma época, final dos anos noventa do
século passado, fui convidado pelo presidente da Câmara de Vereadores Cleiston
Rubens, “Rubinho”, hoje vice-prefeito, e pelo vereador Pedro Jales Neto para
participar, como expositor, de uma audiência pública para discutir a questão da
saúde mental no município, oportunidade que apresentei idéias sobre a
necessidade de uma equipe multiprofissional, a implantação de um centro de
convivência do idoso e a viabilização de Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)
de referência, num consórcio com o município de Patu.
Não seria esta a última parceria com
vereadores de Messias Targino. O vereador Antenor Medeiros, “Nonô”, foi o
advogado da nossa família no processo do inventário de pai Epitácio Andrade,
falecido em 25 de dezembro de 1993.
O vereador Anderson Medeiros participou
ativamente do lançamento do meu livro “A Saga dos Limões – Negritude no
Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno Brilhante”, compondo a mesa de convidados e
representando o poder legislativo local.
A produção do documentário “Cangaço e
Negritude”, da Rede Potiguar de Televisão (RPTV), sob a direção do jornalista
Ana Paula Lopes, dedica parte considerável a personagens messienses, como a
prefeita Shirley Targino, o vereador Pola Pinto e o poeta Basto do Córrego
Verde, além de ter contribuído para esta organização não-governamental receber
prêmios a nível nacional.
A dissertação de mestrado “Lugares de Memória
– Jesuíno Brilhante e os Testemunhos do Cangaço no Oeste do Rio Grande do Norte
e Fronteira Paraibana”, da professora Lúcia Holanda, defendida no final de
2010, na pós-gradação de geografia da Universidade Federal da Paraíba, envolveu
agentes culturais de Messias Targino e estudantes, na sua pesquisa de campo no
município vizinho de São José do Brejo do Cruz, identificando o lugar de
memória, correspondente ao local da morte do cangaceiro Jesuíno Brilhante, em
1879.
O estudante Francisco Ivo Neto, com 8 anos,
participou das etapas da pesquisa de campo da dissertação de mestrado da
professora Lúcia Maria de Souza Holanda, acompanhando o pesquisador Epitácio de
Andrade Filho, coorientador do trabalho, e o poeta paraibano Gil Hollanda,
grande fomentador cultural. O pai de Ivo Neto, vereador Pola Pinto, recebeu
nota elogiosa nos agradecimentos da mestra, por seu trabalho de divulgação da
pesquisa.
Sou presença freqüente em Messias Targino.
Com a professora Cristina Cláudia Ferreira, com quem no último dia 29 de
fevereiro, completamos bodas de porcelana (20 anos de casamento 1992/2012),
fazemos visitas a familiares, como o contabilista Miguel Arcanjo de Almeida e o
empresário Lacerda, além de amigos, como Océlio (na foto acima) e o missionário
Itamar Almeida.
Não foi em vão que escolhemos a cidade de
Messias Targino, para lançar em primeira mão, no dia 10 de julho de 2011, o
nosso livro “A Saga dos Limões – Negritude no Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno
Brilhante”. Trata-se de cidade empreendedora, cuja população está em franca
expansão cultural.
1 comentários:
Epitácio
Acho o máximo o valor que você dá a sua terra e sua gente. Em Patu e Messias Targino já poderia ser feito um museu genealógico, de muito valor para as gerações futuras.
Postar um comentário
Sua opinião é importante! Este espaço tem como objetivo dar a você leitor, oportunidade para que você possa expressar sua opiniões de forma correta e clara sobre o fato abordado nesta página.
Salientamos, que as opiniões expostas neste espaço, não necessariamente condizem com a opinião do Blog do Sargento Andrade.